segunda-feira, 19 de julho de 2010

CORAGEM


“No momento em que nos comprometemos,
a providência divina também se põe em movimento.
Todo um fluir de acontecimentos surge ao nosso favor.
Como resultado da atitude segue todas as formas
imprevistas de coincidências, encontros e ajuda
que nenhum ser humano jamais poderia ter sonhado
encontrar. Qualquer coisa que você possa fazer ou
sonhar, você pode começar. A coragem contém em
si mesma, o poder, o gênio e a magia”. Goethe.

A coragem tem sido uma questão temática da minha existência atual. Há os que dizem que é a primeira das qualidades humanas, pois garante todas as outras. Eu vejo simplesmente como a virtude que mais tem me ajudado a enfrentar o fim do meu relacionamento e a busca de novas maneiras de ser. Adaptar-se a situação é fácil, difícil é aprender com ela. Tem que ter coragem...
É preciso coragem para lutar por si. Viver com alguém que não te olha por inteiro, que nega as suas lutas, que reforça suas fraquezas ao invés de te ajudar a desenvolver tuas virtudes, teu autorrespeito, é talvez o maior ato de covardia que alguém pode ter consigo mesmo, é negar a si mesmo.
Nutrir uma relação de ressentimentos impede o senso se paz. O preço é alto, muito mais alto do que a energia que se gasta em soltar as próprias amarras, em sair debaixo das asas do conforto. É melhor atirar-se à luta em busca de dias melhores, mesmo correndo os diversos riscos que a vida implica, do que permanecer estático como os covardes, que não lutam, mas também não vencem, que não conhecem a dor da derrota, nem a glória de ressurgir dos escombros.
Seria trágico se não fosse sátira... rsrsrs.
O fato é que meu jeito excêntrico sempre dificultou minha vida (é preciso ter coragem também para ser diferente), pois ao me distanciar do convencional, precisei buscar referencial em mim mesma, e isto fez com que eu me perdesse muitas vezes. Claro que tem o lado bom, pois sempre acabo me encontrando, e não apenas o encontro, mas também a busca me faz sentir êxtase, o que é bem gratificante. Isto de me perder, de permitir novos encontros comigo mesma, de procurar e criar referenciais próprios, de arriscar, é algo fundamental. É o que me fundamenta no sentido de dar firmeza, motivação e perspectiva. Além disso, entre erros e acertos, descobri que sempre que me perco é porque vou contra minhas verdades. Ir ao encontro da própria verdade é um ato de coragem. Sinto, como Dostoievski, que mentir para si mesmo está na origem de todas as falsidades. Prefiro arriscar, mesmo em meio as tempestades. E termino com Guimarães Rosa.

“O correr da vida embrulha tudo.
A vida é assim: esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa,
sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem”.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Sobre o amor e o egoísmo.

Em janeiro enviei um e-mail para Gua, desejando um feliz ano novo e ela respondeu que não podíamos continuar fingindo que estava tudo bem entre nós. Eu pensei... pensei... pensei... Em meio à neblina da consciência confusa, conseguia ouvir uma rebelião interna esbravejando palavras incompreensíveis, mas infelizmente eu não consegui entender nada. Retornei o e-mail dizendo que havia percebido um afastamento da parte dela, mas que não sabia o motivo. Então ela se chateou (na verdade, demonstrou estar profundamente decepcionada) e deixou de atender minhas ligações e responder meus e-mails.
Fiz várias tentativas de aproximação, e nada. Nestas tentativas eu queria que ela me desse uma pista do que estava acontecendo (sei, não tem cabimento), mas eu simplesmente não conseguia entender. Então considerei que a compreensão de algo fica borrada quando existe afetividade entre nós e o que queremos entender, e resolvi dar tempo ao tempo.
Dado o tempo, esta semana enviei uma mensagem no celular dela perguntando se podia ligar. Ela respondeu, simplesmente, “pode”. Respirei fundo e liguei. Não lembro como iniciamos, mas sei que ela logo tocou no assunto:
- “The, não tem como a gente conversar normalmente antes de acertamos nossas questões. Eu fiquei profundamente magoada, depois de ter lhe dedicado anos de terapia, você diz que não faz idéia do que pode estar acontecendo entre nós. Isto significa que continuo sozinha com a minha dor. Eu até entendo que seja difícil olhar para algumas coisas, mas eu não vou te acusar de nada. Um dia você vai se dar conta por si”.
Enquanto ouvia isto minha mente fervia, fiquei bem nervosa e confusa, e sem conseguir refletir fui me explicando:
- “A única coisa que pensei como empecilho na nossa amizade é que muitas vezes me peguei angustiada por não conseguir discernir até onde eu podia entrar em sua vida pessoal, pois nossa relação paciente-terapeuta foi muito bem estabelecida e profunda (encaixotei nossa relação num clichê e através desta imagem, parada e fixa, me relacionei – penso eu). Quando eu entrava na sua vida, quando perguntava algo sobre sua rotina, eu sentia que estava sendo inconveniente, ficava desconfortável, e mesmo você dando todos os sinais de abertura, ainda assim, eu não consegui te alcançar enquanto pessoa. A isto se soma minhas atitudes de descuido e egoísmo: eu ofereci pouco. Mais pedi do que me propus a dar. Além disso, cobrei muitas vezes, sem olhar suas possibilidades”.
E então, já com outro tom de voz, ela disse:
- “É isso, você entendeu tudo! Senti que só eu era sua amiga, e você só queria receber, e depois você veio e falou que não percebia nada... eu passei a perceber muita coisa em suas relações, mas ainda está confuso pra mim, por isto pedi suas colocações”.
Nossa conversa não foi exatamente assim, acho que eu não disse tudo o que eu escrevi, mas gostaria de ter dito muito mais. Por exemplo, gostaria de ter dito que “a isto também se soma...” o exclusivismo que eu exijo das pessoas, o despeito que muitas vezes sinto, outrossim, a ingratidão, a secura, enfim, uma série de qualidades negativas que eu preciso substituir por algumas virtudes, que há tempos precisam crescer, florescer.
A semana seguiu sem que eu parasse de pensar nisso tudo. Analisei minhas relações próximas, com meus amigos, parentes, colegas de trabalho, até perguntei a opinião de alguns a respeito destas minhas atitudes.
Notei uma coisa muito estranha: tenho relações em que só eu ofereço, e outras em que eu apenas recebo. Das que eu só recebo, eu cobro muito, cobro que elas compensem o que me falta nas que eu apenas ofereço. Ainda não está claro pra mim, mas tem alguma coisa a ver com esta coisa confusa que tentei descrever. Claro que não só isto, há muito mais por trás desta questão louca, e eu quero conseguir aproximar-me do que quer que esteja se passando dentro de mim. Fico desapontada quando percebo que tenho muito medo ou me sinto ameaçada demais para me permitir entrar em contato com o que estou vivendo, e que por isso não fui (e não sou) honesta ou verdadeira, principalmente com as pessoas que gostam de mim.
No final da ligação, eu disse à Gua que gostaria de me reaproximar, que queria ser amiga dela. Não entendi direito se ela quer, mas eu quero muito viver esta relação, encontrar pontos de contato e de diferença entre nós, que somam, e que pode nos levar a ir mais adiante. Desta vez, cuidarei para que seja uma relação de reciprocidade, e proximidade. Ninguém pode ficar de fora, ou de cima “observando”. Sei que numa amizade não há quem dá conselhos, mas não se mostra, quem ensina sem se expor, sem estar visível. Faltou-me observar, e faltou também acreditar na minha intuição, faltou ouvir aquela rebelião interna que eu mencionei no início deste texto. Mas foi uma experiência estruturante, que partiu de uma relação real, de pessoas reais, de sentimentos verdadeiros. Dizemos-nos amigas. Chama-se amor.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Sobre o fim...

“Falta saber soltar, deixar ir embora. Falta aceitar o fim. Um fim que pode ser definitivo ou não, mas que precisa acontecer como fim, ponto final de uma trajetória. Fazer acrobacias mentais e sentimentais tentando inventar soluções e novas interpretações dos fatos só prolonga o sangramento, enfraquecendo quem sofre”...
... Começo o texto assim, meio que do meio, densamente, duramente, dramaticamente, simplesmente porque é assim que sinto minha dor, pulsante, intensa em mim.
Quando dividimos a vida com alguém, quando nos entregamos à relação corremos o risco de nos anular enquanto indivíduo, de negar nossa jornada individual, única e gloriosa, se desta forma a concebermos. Dar-se conta de estar só, em si, já é possibilidade de transcendência ou decadência.
O medo da solidão nos faz acreditar que o outro sempre vai estar lá, faz prometermos ao outro estar sempre lá, como se a vida fosse algo estático, como se tudo pudesse ser planejado, controlado e mensurado.
Reza o senso comum que um dos principais recursos que utilizamos é a adaptação. Eu até concordaria se minhas experiências não me mostrassem que adaptação acaba por se transformar, na prática, em submissão. Não é de todo o mal, às vezes eu exagero um pouco.
Acho que no fundo eu me considero sortuda por sofrer. Significa que não sou do tipo que acaba adormecendo a sensibilidade a fim de sobreviver. Sou forte porque não suporto o tranco como um boi mudo que leva a carga, e sim como pessoa atenta que não se deixa anestesiar. É do forte tirar as conclusões e aceitar as conseqüências, reconhecer a cruz e viver com ela, ou jogá-la fora e mudar de rumo. É da pessoa que agüenta o tranco fazer o que é preciso, mesmo que não é o que desejaria fazer. E, às vezes, não é falando e agindo que se mostra força, mas justamente o contrário, calando e continuando a andar, custe o que custar. Essa postura é indispensável quando se está rompendo uma relação que dá trabalho, produz escândalos e sofrimento. Ou simplesmente dor. Mas a consciência do que é justo é maior do que o “coitadinho de mim, ou dele, ou dela”. É absolutamente indispensável saber agüentar o tranco quando se aposta em si mesmo, aumenta nossa imunidade psicológica. E isto certamente é mais saudável do que se mutilar para estar com o outro, como quem não acredita que pode ser amado por aquilo que é.